Amor Maduro

Eu quebrei o vidro traseiro do carro do meu filho. Pura barbeiragem. Entrei em pânico, errei, bati, causei prejuízo, fiquei muito mal, afinal serei condenada, estraguei o planejamento mensal da família, serei massacrada.

-Não tem problema, o que não tem remédio remediado está, vamos agora ao vidraceiro e mandar arrumar.

-Como assim? Custa!!!! Custa muito dinheiro! Como vou explicar este gasto?

-Claro que custa, mas tudo tem jeito, tudooo, não é remédio, não é gasto com hospital, então estamos no lucro.

Meu Deus, devo estar sonhando, não tem briga, não teve massacre... nunca vivi isso.

Estamos no meio do caminho: Para!!!! Esqueci meu celular. Putz! Falo ou não falo? Vai sobrar pra mim, vai sobrar mal humor, xingamento, culpa, vai sobrar o lixo do outro em cima de mim, mas claro eu que provoquei tudo isso, a culpa foi minha, o esquecimento foi meu.

-Qual o problema? A gente volta e pega, estamos de carro, temos gasolina, se chegarmos fora de hora eu explico. Por que esse pânico?

-Falei pra ela, que a gente ia ao cinema hoje.

-Hoje não posso tenho reunião, esqueceu?

Pooootameeerda! Esqueci e agora não adianta ela está vindo, meu deus do céu, sou um fracasso, não faço nada direito, causei um mal estar, faço tudo errado, não estou a altura.

-Calma, vai você e ela, encontro vocês depois para um café ou quem sabe um jantar.

Não pode ser, em algum momento isso vai se voltar contra mim, não é possível que eu cause desconforto e não pague caro por isso.

Numa tarde quente e ensolarada, depois de alguns espumantes eu conto para as pessoas reunidas ao redor da mesa como a gente se conheceu, foi gargalhada geral.

Me arrependi, como posso ser eu mesma em uma mesa tão formal, como posso expor de forma simples a complexidade de ser humano(a), como posso furar uma bolha intelectual e social de uma forma tão espontânea e não ser recriminada por isso, não ser taxada de simplória e ignorante?

Posso, sinto que posso, posso me atrasar, posso me vestir como eu quero, me expressar como sempre desejei, posso ir ou não ir e fundamental: Posso confiar. Posso dormir tranquila que sei que existe lealdade e respeito.

Existe calmaria. Sabe um rio calmo, uma praia sem ondas, o silêncio que vem de dentro? Sabe? Se não sabe, eu torço pra que você viva algum dia, um amor tranquilo e maduro, como eu vivo hoje.

Orei, pedi, implorei, jejuei e esse amor chegou até a mim, não da forma como eu esperava, mas chegou e me faz feliz. Me faz tranquila e plena.

Enfim: O amor maduro.